domingo, 30 de outubro de 2011

Latente.

Eu não choro há muitos dias, eu teria motives pra chorar se continuasse somando as coisas leves, agrupando elas em montinhos até que obtivessem peso, até que pinguinhos de lágrimas começassem a escorrer lentamente do canto do meu olho até o canto da minha boca, e eu me escondesse num cantinho toda auto-piedosa, toda melindrosa, e como uma menininha que foi mal interpretada ...Eu poderia.

Eu não choro há muitos dias, engulo a seco certas friezas, me inflama a garganta ai eu fumo um cigarro, e dou uma gargalhada, porque eu posso ser dissimulada e meticulosa, visto essas defensivas como roupas novas, te encanta?

Eu não choro mais, penso que logo meu nervos vão expelir do tanto que incham em certos momentos, e as lagrimas esvaecem ainda dentro, nenhum sinal de fraqueza, até as pernas que não jogo pro alto, enfio no salto, me agüentem, eu faço isso a vinte e tantos anos, e não me canso.

Eu não choro há muitos dias, e isso faz com que eu pense demais, eu repito que penso demais porque me cansa certos pensamentos, e outros me assustam, eu me assusto, e controlo certos sussurros, pensar alto me postariam ao lado do marques de Sade em uma jaulinha para perversos, ou pervertidos, eu não choro nem mais tanto por libido.

Eu não choro mais, mas por favor não insista, não há segurança que persista a tantos desencontros.

terça-feira, 25 de outubro de 2011

...

Victor tomou como insistência, pensar que depois de tudo ainda pode me falar das coisas, ou que tem muitas coisas para me falar ainda, ele insiste em santificar uma afeição morta, e eu também, por dentro, envergonhada disso.
(Victor nunca saberá.)
Dois necromantes de sentimentos que somos, evocando aquilo que já está fecundando em outro plano, apenas porque um dia foi belo, um dia foi bom, uns dias nos completou como almoço de domingo.
(Victor não saberia, pois almoça sozinho.)
Evito pensar o quanto isso faz mal, como o moinho evita a água que passou. Evito pensar que posso lhe falar coisas, evito pensar nas tantas que ele precisava ouvir, e que talvez o fizessem crescer ou sucumbir.
Pois eu venho sucumbindo, quando ele fala das cores dos pássaros naquele verão, da cor que tinha o cheiro que eu emanava. Eu venho sucumbindo quando Victor se ilude me iludindo.
Victor querido, não volta a ser algo, o que virou nada.

(Victor nunca acredita em mim.)

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Meu amor, essa é a última oração

Que você me sirva de inspiração, com todo o meu desprezo e com toda minha tietagem que revezadas me invadem, e que disfarçadas de menores te tocam. Que você seja meu impulso e meu freio... Um conselho subconsciente para os consentimentos e negações que a vida vai me propor.

Que eu te sirva dentro de alguma forma, da forma como tu serves nos meus cobertores, e eu nas suas roupas, ou da forma que crê que eu possa vir a servir. Que nossos jogos nos brinquem menos do que brincamos com eles... E que como todo brinquedo, um dia possamos vir a enjoar deles.

Que a vida se enamore de nós,e que apaixonadamente nos sirva todos os dias de beijos

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

(...)

Não sou enganada, não dessa forma onde posso ser vista com penalidade.
Permito me enganar, como se estivesse na minha lista de exercícios do dia. Até onde suporto? Até onde você é capaz de ir?
Por tantas vezes penso, que a cada dia que passa podemos mais. Mas há dias que mesmo com um sol e uma brisa leve, que daria forças á muita gente, eu me encontro pedindo mentalmente um basta, inconscientemente uma trégua á mim mesma, dessa minha farsa de cabisbaixa quando meu pescoço quer subir como uma girrafa.
Hoje escrevo pra escorrer mais uma vez, escrevo para evitar o soco na face, que eu daria, em troca do soco no estômago que recebi de ti, ao te descobrir nas suas entrelinhas, novamente.

Escrevo pra te pedir que aprenda a me enganar melhor. Te descobrir esfria meus pés uma noite inteira.

terça-feira, 13 de setembro de 2011

...


As vezes eu preciso de um amigo para brincar, as vezes preciso de um brinquedo.

As vezes eu preciso de algazarra, mas na maioria das vezes eu preciso de silêncio.

As vezes eu preciso de manhãs, mas quero todas as noites.


Eu sempre preciso de uma válvula de escape.

Meus pensamentos são viajados.

vigiados.

aviadados.

Ventosos,e alados.

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Uma chuva, e umas vidas

Todo esse barulho de gente que ri, gente que chora, e outros que sabem imitar e vivem como animais.
Buzinas de carros, caminhões levando a vida de uns para apartamentos de outros.
Todos os espelhos da mentira e os travesseiros da verdade.
Todas essas vitrines e propagandas, toda a vulgaridade muito bem propagada, todas as falas de muitos que dizem nada.
Toda essa cidade de asfalto e muros de pedras, todos os sapatos de bicos finos e os pés descalços.
Toda mendicância e toda barganha, toda conquista e toda perca, tudo que se retém e tudo que se esvaece.
Toda criança que vai ficar velha, todo velho que não viu ainda sentido na vida.
Toda essa vida e esse cheiro de vida.
Toda essa vida e esse gosto de vida.
Todas as mãos e as mentes que as moldam.
Todos os pés e os pentes que as alinham.
Toda a vida de tentativas de sanidade em meio ao excesso de loucura.
Toda a minha e toda a tua, que se encontram na avenida barulhenta com um sorriso e, se despedem na esquina do semáforo com esperança de se reencontrarem.
Toda a minha por toda a tua.

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Devaneios brotam.

Estou tão sólida por dentro que qualquer movimento me arranha, essa fricção me arde, me ferve, tanto que fico líquida, mas viscosa.
Um líquido sem leveza, e por isso da busca contínua do leve, me fazendo sair á louca em madrugadas quase insólitas se não fossem os grunhidos de felinos se amando… Saiu a busca de um ralo, onde eu possa me escorrer.
Tão necessários esses ralos, onde me extraio do denso, do pesadelos, da intensidade.
Pessoas não podem ser ralos, pessoas falam, e falam sem consentimento por quem precisa ser ouvido e nada mais. Pessoas falam, como se guardassem nos bolsos opiniões impressas prontas para serem destribuídas em situações como essas.
Pessoas e opiniões não podem ser ralos, quando ambos são o que solidificam, iniciando todo o processo, todo o ritual.
Preciso de ralos e rolos de pergaminho. Preciso escorrer como tinta, independente da cor que me misturo. Preciso ir me deixando aos poucos, em pedaços, em pegadas. Cada proximidade de solidez me espanta.
Não posso solidificar pensamentos líquidos, não me permito endure(brute)cer.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Tangerine


Não adianta eu insistir nessa eterna procura, daquilo que já encontrei, nada adianta eu insistir em achar em outros trejeitos a pose que tu para.
Ninguém entenderá da astrologia de meus atos, posso explicar toda a posição dos planetas a todos esses outros planetas que eu tento habitar, mas não, só você entende essa juncão, leão e escorpião, e te pareçe triste como á mim, nossos limites bem traçados, e a gente tentando atravessar ele a todo custo.
Não, não te peço que retorne, embora eu te peça todos os dias antes de dormir, no silencio extremo que só o pensamento pode selar. Você vem das trevas, ou do paraíso que se estabeleceu apenas pra me tirar das confusões que me meti, pra limpar um pouco a minha imagem, e eu vou com você reclamando muito, como se purificar-se fosse das tarefas da vida a mais tediosa, e é.
Vivemos e vingamos nosso tédio, há quantos anos mesmo? Há quantos anos nos encontramos e insistimos em se perder, apenas pra continuar a busca, e ser mais dificil depois? Há quantos anos tú brilha em mim como sombra, e eu brilho em ti como fosco. Sempre tentando se disfarçar, ser icognita uma pra outra, quando na verdade pouco nos surpreende, pra não dizer nada, e acabar outra vez com essa farsa?
Uma farsa, é o que somos? Ou a mais extrema realidade que fugimos? Fugitivas uma da outra, entrelacadas como se serpentes que se amam. Enos amamos? Nos amamos sim.
É por isso que essa manhã vou fugir, pra qualquer lugar longe o suficiente de tudo o que procuro, e perto o suficiente de tudo que encontro. Não me espere, mas me espere sim, todos os dias.
Hoje prefiro a verdade cintilante do encontro, que a mentira eterna dessa busca.
Me reencontre em Montauk.

terça-feira, 26 de julho de 2011

O retorno de Margot.

Margot me habita novamente, em segredo, como ela gosta. Margot fuma cigarros na minha banheira, usa minha imagem no espelho sem eu conceder isso á ela.
Ela diz que ela em mim, é o mesmo que explicar detalhadamente cada pergunta que eu fiz ás paredes, ela não sabe contar quantas foram, mas quando parte acha que me fez bem.
Margot segreda nos meus ouvidos segredos dos os outros, só porque me envolvem um pouco, acho isso cruel. Me fala de forma quase poética, que eu virei palavra quando fui falta, que sentiram minha falta enquanto enumeravam meus erros. Ela ri, e diz que eram tantos.
Margot sempre tão muda, em mim tagarela, como se escrevesse um livro, eu sendo o papel sempre. Margot sempre me faz chorar, quando vem assim sem avisar, esporádicamente.
Margot chegou nessa noite com malas enormes, sem data pra voltar.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

...

Pensava sim, que assim as coisas fluiam, que o que nos saturava, antes de nos vazar as bordas nos preenchia por completo, e por isso nos valia.
Sempre o excesso de tudo, o ápice.
Se não me tocasse as bordas , foi porque o dentro estava oco, e de dentros ocos eu tinha reminiscências engarrafadas na sóton de casa, juntando o pó merecido.
Aí o desgosto foi tanto diante a repetições de ocos e semi-ocos, que o ápice virou artigo de luxo, que sentamos no cômodo, e não esperamos por mais nada.
Mas hoje lembrei dele, meu oco de tão oco, faz com que eu ouça o eco dos meus gritos internos.
Por favor, me sature.

sábado, 16 de julho de 2011

Se vê.

Ela chegou assim, sorrateiramente na calada de uma noite que não era uma noite qualquer. Ela chegou como chega a chuva no fim de tarde, e me pegou desprevenida.Chegou em uma noite que eu era um feixe de luz, que minha alegria cintilava e ofuscava aquele dentro triste que ainda existia. Ela chegou como gato vagabundo que pisa nos telhados sem fazer barulho, mas em mim, ela fez alarde.
Poderia tocá-la se assim quisesse, pois tantas vezes ela deixou a mão vagando perto da minha, mas temi que ela esquivasse, não sei como ela se fazia, se-fazia-se.
As palavras que foram trocadas em outros dias, em tantos outros, foram a melhor barganha, ela parecia ter nos bolsos todas as peças perdidas do meu quebra cabeça. Eu me via no olho dela, e acho que ela se via também no meu, mas nunca me falou se via dentro dela o que eu via dentro de mim, quando ela vinha descendo a rua.
Eu nunca falei em amor com ela, acho que me proibi de qualquer coisa que apressasse as coisas, e eu que sou toda ás pressas, me contrário por um cuidado, um zelo que ela não me cobra e eu dou de graça.
Há alguns dias desses que nascem e morrem, dia como todo santo dia, ela deixou a mão vagando e alguém segurou, alguém que decifrou nela uma pressa que minha calma me impediu de ver. Minhas mãos vagam hoje.
Me perco em meus cuidados como quem erra tentando acertar. E eu que só queria saber dela, se ela via isso que eu vejo, que nos ronda,mesmo ela atando a mão aquela outra.

De nós bichos...ou nossa extinção.

Eu sei que é o mínimo que pode fazer, fixar a mira no meio dos meus dois olhos e tentar me ferir, eu sei da sua mira, e sei porque não o faz.
Eu sei que minha atenção não te é mais artigo de luxo, mas ao mesmo tempo te é pão de cada dia... Eu sei que me rodeia de armadilhas pra ver qual eu serei mais tola de cair, porque o tempo te apagou a lembrança de qual que caio fácil... Aí tu monta várias delas e fica na espreita. Eu sei que me quer empalhada na sala da tua casa porque um dia mordi tua mão, mas não, não te temo.
Sou bicho do mato nessa cidade de pedra que a gente habita se desviando, e na infeliz coincidência, sempre se encontrando. Sou tua caça de ouro, e mal te sei caçadora, porque meu olho de felino ainda vê no teu olho de lebre aquele medo, mesmo eu não querendo mais te morder, mesmo eu não mais te querendo pra nada.
Um dia pensei que se meus dentes cravassem fundo a sua pele, e um deles ali ficasse grudado, você faria dele um colar, um amuleto... Como eu fiz de teus conselhos que muitas vezes me rasgavam a alma. Mas hoje a dor que nos fortalecia ontem, nos enfraqueceu, ao ponto de o meio dos meus olhos te ser um alvo, e o teu par de olhos me ser um desvio corriqueiro.
A gente se entregou a nada nessa selva que cada dia que passa se extingue mais, apenas por um capricho. Por um marcar território.
E eu que não sei mais se tu é bicho ou humano, mas me auto afugento pra toca, porque essa arma que me aponta na calada da noite me faz rir, mas esse medo no teu olho me aterroriza.

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Para minha pobre Maria, e Luna e Lorenzo.

O dinheiro acabou, ainda no começo do mês Maria, mas tudo bem a gente tem os malabares no sinal, e as camisetas cheias de cores e ideologias que a gente pinta-e-vende por trocados, mas que salva o pão e o vinho, e não rezamos.
O dinheiro acabou, mas agente não vende a alma, nem a mãe, a gente estica a nota, compra o café mais fraco, compra no outro mercado, aquele que caminha se mais.
– me vê aquele vinho de dois reais... A gente dá um jeito.
Prometemos que se sorríssemos e trocasse carícias de manhã a gente estava bem. Ai eu riu do seu pão seco com café, mesmo com aquela larica, e você ri do meu dedo que foge da meia, e a gente se abraça, rindo a beça de o quanto nós nos tornamos cordiais com a situação que nos metemos, apenas pra estar livres, tua asa atada a minha, e meu riso que termina no canto da tua boca.
De noite é frio de matar aqui, ai a gente faz fogo, e chamamos os amigos, um trás o violão, outro o bolo da mãe, os vinhos dão-se cria, e a gente se vê assim, tão anfitriões desse nada lindo. A casa cheia, os gatos (Luna e Lorenzo) aninhados nos colos dos amigos, como se eles apadrinhassem nossos únicos filhos, e toda essa sincronia fez minha Maria dançar no meio da sala, embebedada de vinho, uma meia de cada, toda linda com os cabelos soltos.
O dinheiro acabou, ainda no começo do mês, mas ontem Maria dançou na sala, atando cada vez mais meu coração na nossa liberdade, e assim enriquecendo nossa pobreza.

quarta-feira, 13 de julho de 2011

Devaneio sobre sofás,pássaros, pessoas e repetições.

Eu tenho um sofá vermelho. Na verdade a minha mãe tem um sofá que era florido e meu gato arranhou todo ele ai ela colocou uma capa vermelha e ele virou um sofá vermelho.
Mas como eu falava, na minha casa tem um sofá vermelho, e eu sempre quis ter um sofá vermelho, e depois conheci muita gente que queria ter um sofá vermelho, e foi pensando no sofá vermelho, este que passei essa manhã toda sentada, que eu deixei vir á tona algumas realidades da vida, da minha vida.
Nada aqui me pertence, exceto as roupas, e algumas ainda são emprestadas. E logo que eu também não pertenço a esse lugar.
Minha mãe falou na minha infância inteira, coisas bonitas sobre “quando você crescer, quero te ver voando como o mais feliz dos pássaros”. A idéia de eu sair por aí “voando” me alegrava tanto, que eu não dei vazão ao pensamento de que essa espécie de pássaro-humano que eu poderia vir a me tornar, era na verdade um “pássaro” sem bando. Não pensava que ia ter que planar e explanar tantas vezes na mais obscura das solidões.
Nessa manhã no sofá vermelho, eu me peguei fazendo novos planos de “vôo”, e guardei-os com todo cuidado na esperança, para realizá-los como quem caminha sem pressa...Quem passeia.
Dessa vez vou deixar bem claro para mim as possíveis dores de um “vôo” para que eu não volte aterrorizada ao “ninho”.
Nessa manhã no sofá vermelho, eu me vi tirando gente da minha vida, tirando elas do assento confortável do meu futuro sofá vermelho, talvez para sempre, e dando posição pra aqueles que já estavam ali no chão há tanto tempo esperando um lugar melhor. A intenção nunca foi ter que tirar um para por outro... Mas alguns na verdade já saíram sem eu ver, e deixaram aquele lugar vago... Ainda com o cheiro deles, mas vago. Outros vandalizaram tanto o assento que estavam do meu futuro sofá, que tive que retirá-los antes mesmo de tê-lo.
Como eu falei, conheci diversas pessoas que queriam ter um sofá vermelho, e eu tenho um falso sofá vermelho, que não é meu. Mas hoje eu sei, que ele não é meu, e que tenho que ir voando como quem passeia, até poder esparramar me no meu autêntico sofá vermelho... E talvez fazer um chá pra quem aqui ficar... Até lá.

terça-feira, 12 de julho de 2011

Pra ti, chuva.

Começou a chover justo agora, eu pensei em escrever, e ajeitei todas as coisas, acendi um cigarro, e coloquei mais um pouco de café na xícara, fui escrever a primeira letra, que agora não recordo que letra que era, e começou a chover, justo agora.
Eu nunca te falei, mas entre tantas coisas que eu nunca te falei está essa, que eu sempre pensava em você quando chovia.
Não tivemos nada marcante em um dia de chuva, não que eu recorde ao ponto de te associar todas as vezes, mas quando chovia me dava aquela sensação... Aquela de quando chove e você tá dentro de casa, você se sente seguro, e tão confortável que se te cobrem os ouvidos tu adormece, e se possível tem um sonho lindo. Essa sensação se igualava quando você chegava e me olhava daquele jeito, que teus olhos brilhavam... Eu me sentia em casa, sentia que estar dentro dos teus olhos, minha voz no teu ouvido, a tua voz tapando os meus, era o melhor lugar pra se estar, pra adormecer e ter sonhos lindos em dias como hoje, que chove lá fora, e aqui dentro.



Tenho uma goteira de dentro pra fora, talvez eu ponha um balde nos joelhos.

Um favor.

Quando me virei ela não tava mais lá, me virei de tantas formas pra tentar amenizar o “ela não está mais aqui” que quase entortei, acho até que entortei um pouco sim.
Minha boca ficou meio torta de tanto que apertei os dentes para não gritar, e meu seio esquerdo ficou meio torto também de tanto eu tentar reter o coração, e esse tentava pular peito fora, feito louco, procurar ela. Não pude permitir que ele fosse e se machucasse, chorasse ali quietinho comigo a noite toda, e esperasse, ia passar. E assim fizemos tudo meio torto, eu com a boca cerrada, o seio torto, e os pensamentos que vez ou outra entortavam pra uma saudade.
Aos poucos foi passando, na verdade vinha passando, e aos poucos eu fui achando outras coisas que ocupassem o cerne dos meus pensamentos, mas toda noite, quando largava essas outras coisas bagunçadas pela casa ela voltava, não ela a pessoa, ela a lembrança, ela a pessoa eu sei que se partiu não ia voltar.
Aí o tempo foi passando, não sei dizer quanto tempo que foi passando, mas passou-se algum tempo, e eu dizia não pro pensamento, sempre que ele ia pé por pé ao escuro da noite, revirar aquela caixa cheia de lembranças dela... No meu sono leve eu ouvia os passos dele, e acordava antes que ele a colocasse em sonhos, ai eu pegava ele no pulo e dizia não! Ele voltava resmungando pra outras coisas, como pra me dizer pra levantar e fazer um chá de morango no meio da noite, e eu ia-e-fazia o chá, e dormia.
E foram vários dias, de brigas e nãos á todas as partes do meu corpo que queriam ela, como se fossem filhos pequenos eu tentava ensinar, que o outro é outro corpo, outras partes como todas essas minhas, mas que são do outro, e o outro é livre, e que ela que bem sabe se vai, ou se fica, e eu repetia que o outro é livre todo santo dia, quando a mão me segura o queixo tão forte, e a outra me bate a cara, e o pensamento me solta na voz a pergunta:
- E quando você vai nos libertar dela?
E eu não sabia, não fazia a mínima idéia, então chorei encostada no meu próprio ombro, eu chorei tanto que minha mão afagou meus cabelos, não saber deixar me livre dela, era mais doloroso que aceitar a liberdade alheia, que eu já tinha aceito, que acreditava já ter aceito. Não sei dizer quanto tempo chorei assim, mudando de um ombro pra outro, só sei que até meu estômago complacente com o meu pranto, não pediu alimento algum, nem café, nem bebidas alcoólicas, como ele fazia nos outros prantos. Eu e meu corpo, meu corpo e eu, jogados feito saco de pipoca no sofá por um tempo que eu também não sei dizer quanto tempo foi, mas que enfim entendemos que ela se foi, e que tínhamos que nos virar.
E nos viramos muito bem, até limpamos a casa, subimos no cargo da empresa, flertamos com a vizinha morena e á levamos pra cama, e gostamos um bocado, e a gente saia nos finais de semana, e conhecemos amigos novos, e ai... Ontem eu vi ela que partiu, passando na rua de mãos dadas com outras mãos que nãos eram as minhas, e enfiei as minhas no bolso pra que chorassem quietinhas.
E todas essas palavras, que te contam essa história de um corpo que não-sabe-se-lidar, são apenas um favor que to fazendo ás minhas mãos e meus pensamentos, por deixá-los tristes hoje de novo, depois de tanto tempo.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Bilhete no vidro, bem vindo, findo.

Com uma plenitude que transpassa a pele impermeável
á sentimentos perfuradores cheios de tétano,
e mal secos expostos á um sol enferrujante,
Te falo quase como se desenhasse,
as palavras que te negam a sobrepor-me.

Te nego a aproximação carregada de caos,
que vem nas tuas malas cheirando a naftalina.

Te nego a pele que tanto te anseia, na intenção de te travar o inicio de uma luta,
e finalizar em mim a guerra da eterna dúvida... Se bem te quero, ou mal sei perder-te.

E se nos fins de cada recomeço da nossa contínua infecção verbal,
eu sobreviver sem teu amor esburacado,
arranco meu acomodado coração pulsante,
do conforto do ninho por mim construído no teu interior.

Jogo ao vento para que voe, como passarinho livre,
que antes sempre soube ser.