terça-feira, 8 de janeiro de 2013

ainda..intitulado.

Ecoa a voz dela na minha cabeça. Um pouco rouca, entre um real absoluto e um sarcasmo um tanto dúbio. Uma voz que pudera eu esquecer por um segundo o tom exato. Guardo sempre a mesma frase: -Você sabe o que vai acontecer meu bem. Guardo sempre aquele riso dela também. Mas sobre a frase...Eu sabia! E desconversava e ria disso antes, por saber o que ia acontecer e não suportar saber, ou foi por ela, pra lhe fingir uma esperança de que uma mudança repentina cairia como chuva pra essa terra seca que rodeavam nossos dias. Eu precisava demonstrar que acreditaria nisso, pra que talvez ela viesse a acreditar... _____________________________________________________________________________ Dizem que amor é uma coisa eterna, eu digo que o tempo é a única coisa eterna, e o amor pode ser o que distraia melhor essa suposta eternidade, ocupando tanto a cabeça quanto todo o corpo, e nos empurrando lentamente para o limbus da insanidade. Mas sim, ocupei boa parte da minha suposta eternidade com essa distração, amei quase uma vida inteira. Eu relutei muito até admitir que essa fosse mais uma história de amor, barganhei ela do meu próprio esquecimento. É uma história minha que não dói mais, embora eu também não possa contá-la mostrando os dentes o tempo todo. Acho mais justo apresentar ela primeiro, a outra pessoa, o outro lado do meu mundo inteiro, ainda que o de cá também tivesse vestígios, fios de cabelo, restos de perfume na cabeceira. Seu nome de bruxa, de novela, Helena... Que me fez ter cavalos de troia no interior, a guerra, e coração galopante. Helena com pele de paz, e lutas nas entranhas. Cabelos ondulados, sempre de lado, como ela também andava um pouco de lado, sem nunca se postar diretamente sobre coisa alguma, mas era isso que me chamava atenção, essa desenvoltura dela, era como se ela flutuasse sobre qualquer coisa que não lhe dissesse a respeito, mas mergulhasse profundamente nela mesma. Helena tinha um problema quando ficava triste, e eu consegui diversas vezes fazer ela sorrir, por essa razão pensei ser a cura. Hoje indico que ninguém nunca pense essas tolices. ______________________________________________________________________________ Só eu sei como gosto dessas chuvas de verão, mas ainda que eu adorasse ver na fotografia do céu as nuvens se fechando, meus olhos já tamborilavam por toda a rua pensando se daria tempo de parar embaixo do toldo do cinema antes que os obesos pingos começassem a cair. Deu o tempo exato. (Naqueles dias, ainda que eu fugisse da matemática das horas, muitas coisas vinham sendo exatas... Minhas palavras para conseguir as coisas, as respostas das pessoas, alguns olhares, e o tempo. Vinha tudo dando certo, eu mostrava meus dentes um pouco tortos por qualquer motivo, era o que alguns amigos chamavam de “boas vibrações” . Eu acredito que o verão sempre me despertava isso, esse ar de felicidade, de vida... Não que as outras estações me proporcionassem um inverso, não! Mas o verão sempre me seduziu). Embaixo do toldo do cinema, fiquei um pouco decepcionada ao descobrir que o próximo filme só começaria dentro de uma hora, mas o título valia a pena esperar, já havia assistido( Quem tem medo de Virginia Woolf?)... Uma vez antes, mas para um cinema alternativo de fim de tarde, acho que nada mais perfeito. Acendi um cigarro e fiquei olhando a chuva linda, as pessoas correndo. Tive que fechar o zíper do casaco, nessa cidade qualquer chuva significa um ar frio, ainda que no verão. Estava totalmente absolvida por algum pensamento que não sei dizer agora qual era... Quando como se de um sobressalto eu acordasse de um sonho, em outro... Em meio a tanta gente que corria, vinha aquela garota, dos cabelos ruivos, longos, com um vestido azul com flores brancas, tão encharcados quanto seus cabelos, e ela andava... Entendi que pelo tanto que estava molhada, nem adiantava mais correr mesmo. Eu tentei desviar o olhar, mas ela parecia uma espécie de anjo, aqueles cabelos uma espécie de sol, e o arco-íris dessa ciência da natureza, se fazia na minha barriga. Confesso que me senti tão tola, lá sobre o toldo, completamente seca, confortável. Ela me viu olhar, eu desviei, quando olhei de novo ela continuava me olhando da mesma forma, eu desviei novamente, quando olhei de novo ela continuava igual, porém mais próxima, eu engasguei com a fumaça do cigarro e decidi não olhar mais. Quando olhei de novo ela tinha desaparecido. Ouvi uma voz um pouco rouca, do lado ao contrário de onde ela ( a talvez miragem) vinha ( voz de Courtney Love), me pediu um cigarro, expondo uma carteira de Malboro completamente encharcada, e um como quem paga por ele me deu um sorriso lindo. ( nessa hora eu me agradeci de estar seca, sobre o toldo, fumando um cigarro). Após acender o cigarro, e dar uma baforada á todo pulmão, olhando o outro lado da rua, como se eu não existisse mais ali, ela vira pra mim e fala: -Sou Helena, e não tenho medo de Virgínia Woolf. E eu sou a Clara, e tenho! (...)

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